"That was due to Crabtree's expertise and flair during a wine tasting that lasted until sunrise, and that is still remembered in the neighbouring town of 'Vila Real´as the "Night of the Englishman', that Don José Mateus first realised the potential of his Estate's Rosés as suitable for the English palate"

Santos, Bartolomeu dos, 'Joseph Crabtree and the Caliph of Fonthill', 1985, in The Crabtree Orations (1954-1984), ed. Brian Bennett & Negley Harte, The Crabtree Foundation, London, 1997
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21.5.08

Artigo de Paula Lobo no Diário de Notícias (17.9.06)

O quadro de Paula Rego que veio num Fiat 600 Paula Lobo

"Não levas a tela mas podes ficar com a tábua", disse-lhe o amigo escultor, considerando-a troca justa pela ajuda na mudança de atelier. A "tábua", com a figura esguia da Prima Manuela pintada a óleo, acabaria por vir de Londres para Portugal em Julho de 1958, "encostada à janela de trás do Fiat 600, a uma velocidade máxima de 60 quilómetros à hora". Nessa altura, Bartolomeu Cid dos Santos ainda não conhecia a artista que, com apenas 18 anos, pintara aquela obra que o impressionou pela qualidade. Quase 40 anos depois, é com visível prazer que exibe 22 trabalhos seus e que fala da longa amizade com Paula Rego.

Inaugurada ontem no Centro de Arte Contemporânea da Amadora, um espaço municipal que tenta levar cultura aos novos bairros residenciais de Alfragide, Paula Rego: Pintura, Desenho e Gravura/Colecção Bartolomeu Cid dos Santos é, para abreviar conversa, uma história de cumplicidade. Contada ao ritmo dos postais de Boas Festas enviados de Inglaterra, dos casamentos, das aguarelas ou águas-fortes oferecidas nos almoços de reencontro em Sintra, a cada Agosto.

Uma história cujos capítulos saíram das gavetas onde Bartolomeu guarda os presentes de Paula, e que desde Maio de 2004 já foi revelada na Azambuja, Caldas da Rainha, Tavira ou Setúbal. "Esta exposição é a Paula Rego dos pobres", atalha logo o artista com humor, "porque, normalmente, para ver originais dela é preciso ir a Serralves ou à Tate".

Tudo começou em 1961, quando Bartolomeu Cid dos Santos regressou a Londres para dar aulas na Slade School of Fine Art. Cinco anos antes, por pouco não se cruzaram na escola: ela saiu em Junho, ele entrou em Outubro. Mas, nesse ano de 1961, "apareceu uma rapariguinha a dizer 'eu sou a Paula Rego e venho recomendada pelo Jorge Vieira'. Entabulámos conversa e ficámos amigos". Só recentemente, conta Bartolomeu, Paula confessou a artimanha: "Não fui nada recomendada! Não te conhecia e essa foi a maneira de me apresentar..."

Ao Retrato da Prima Manuela, de 1953, foram-se juntando ofertas com dedicatórias sentidas. A primeira, um desenho a três cores que de imediato se associa às conhecidas colagens dos anos 60. A última (da exposição), um estudo de 2004 para The Pillow Man, já muito semelhante ao óleo exibido em Londres pela Tate, mas ainda com "marcas de trabalho" no papel. "Vê-se mesmo que está à procura", diz com admiração Bartolomeu Cid dos Santos. "Sente-se a mão. A Paula pinta como os velhos mestres: precisa de modelo e de estudos.

"Aguarelas, litografias, águas-fortes e águas-tintas, desenhos impressos e coloridos depois, obras a pastel, tinta-da-china ou grafite, a colecção evolui com o refinamento do traço e a transição da mancha para subtis gradações de cor. Aqui estão também muitas personagens de obras famosas de Paula Rego. Os coelhos e a formiga rabiga, os pelicanos, as meninas e os adultos de expressão lasciva, as mulheres das séries sobre o aborto ou Jane Eyre.

Imagens de múltiplas leituras, carregadas de ironia, sexualidade ou violência, que a exposição procura contextualizar com fotografias do atelier londrino da pintora, o mundo onde encena essas fábulas com bonecos de trapo, vestidos antigos e gente lá de casa.

Para o amigo Bartolomeu - que deixou a Slade School como catedrático ao fim de 35 anos, fez carreira internacional na gravura e tem obra no MoMA de Nova Iorque, no Albertina de Viena ou no British Museum de Londres -, Paula Rego não é só uma grande pintora. É também, garante sem hesitar, "o melhor gravador português". E uma pequena amostra do seu talento ficará na Amadora até 31 de Outubro.